quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Lignotúber: o que é e para que serve nos eucaliptos...

Fonte: Celso Foelkel (Edição 28/junho 2010 - EUCALYPTUS – ONLINE BOOK & NEWSLETTER)

Lignotúbers ou lignotubérculos são estruturas desenvolvidas por algumas espécies de vegetais para se adaptarem e resistirem a condições adversas do ambiente onde vivem ou viveram no passado ao longo de seu desenvolvimento. Eles aparecem inicialmente nos indivíduos jovens como pequenos caroços ou protuberâncias próximas ao colo ou coleto das plantas. Isso porque se formam preferencialmente nas axilas dos cotilédones; portanto são encontrados especialmente nas plantas seminais (originadas de sementes). Existem evidências de que a capacidade de formação de lignotúbers não é restrita apenas à região cotiledonar, mas que eles podem também ocorrer em nódulos ligeiramente acima do nódulo cotiledonar em algumas plantas, inclusive nos eucaliptos. Por essa razão, brotações jovens, colhidas como estacas diretamente do lignotúber, podem também vir a desenvolver lignotúbers, quando propagadas vegetativamente por estaquia. Esse fenômeno acabou sendo denominado de "efeito de posição para a formação de lignotúber", tirando assim a exclusividade da formação de lignotúber apenas em plantas seminais. A própria indução de formação de lignotúbers tem sido realizada com sucesso por diversos pesquisadores. Entretanto, esses conhecimentos não têm sido ainda transformados em resultados práticos na propagação vegetativa dos eucaliptos.

A missão principal do lignotúber é oferecer ao vegetal a capacidade de se defender e sobreviver das intempéries do clima ou da ação antrópica e de predadores: déficit hídrico, geadas, fogo florestal, ataque de pragas, corte das árvores na silvicultura, derrubada das árvores por ventos fortes, etc.

A anatomia das células dessa estrutura indica que o lignotúber apresenta os mesmos tecidos que qualquer planta lenhosa: câmbio, floema, cerne, alburno, parênquimas e canais de goma. Portanto, anatomicamente o lignotúber não diferiria de outras partes do caule. Entretanto, as diferenças do lignotúber e do restante do caule são quantitativas: temos no lignotúber uma proporção muito maior de células parenquimatosas de reserva e uma grande concentração de gemas dormentes e protegidas de tecido meristemático. Isso sugere que o lignotúber tem dupla função: ser um órgão de reserva (dai a origem do nome lignotubérculo) e ter uma enorme capacidade de brotação de gemas, no caso de algum dano ao caule da planta. Quando a parte aérea da planta sofre algum dano grave, até mesmo sua remoção pela colheita da árvore, o lignotúber passa a ser vital para a sobrevivência do vegetal. As gemas dormentes, valendo-se das substâncias de reserva próximas, passam a se desenvolver rapidamente para substituir o caule danificado ou removido da planta. Portanto, plantas com lignotúber possuem alta capacidade de brotação e regeneração após a perda da sua parte aérea viva. Entretanto, plantas sem lignotúber também podem brotar, mas os cuidados com a fisiologia e recursos para favorecimento dessa brotação devem ser conhecidos e aplicados para maior chance de sucesso nesse tipo de propagação e manejo florestal.

Os lignotúbers são importantes órgãos regenerativos de alguns vegetais, não apenas para as condições naturais, como também devem ser conhecidos e utilizados para melhorar o manejo das plantas em condições de plantios comerciais. Dentre esses conhecimentos sugere-se que sejam observados fatores tais como: altura de corte da árvore na colheita, integridade da cepa, fatores de clima como insolação e calor e respeito à região do lignotúber.

Apesar dessa intensa capacidade regenerativa e de formação de brotos, não existem evidências de que o lignotúber se constitua em uma vantagem para maiores percentagens de formação de propágulos pela técnica da cultura de tecidos vegetais. A multiplicação vegetativa desse órgão em relação a outras partes normalmente usadas por essa técnica não tem mostrado vantagens evidentes para o lignotúber.

Os lignotúbers são freqüentes em espécies de eucaliptos, tanto no gênero Eucalyptus,como Corymbia. As espécies Eucalyptus urophylla, E.robusta, E.tereticornis, E.saligna; E. globulus, E.cinerea, E. obliqua e Corymbia citriodora em geral apresentam claramente o lignotúber em mudas jovens seminais. O mesmo ocorre para alguns híbridos, como o conhecido Eucalyptus urograndis. Algumas espécies podem não apresentar o lignotúber, pois essa formação tem origem genética. Há casos, por exemplo, onde E.grandisapresenta e outros onde não apresenta lignotúber (na maioria das situações). Quando a espécie não mostra lignotúber, a rebrota e condução das plantas devem ser mais cuidadosamente manejadas e gerenciadas. O corte das árvores deve ser mais criterioso em altura e também se deve evitar danificar a casca para garantir boa rebrota. Ou seja, a inexistência de lignotúber não indica incapacidade de brotação, apenas que maiores cuidados devem ser tomados na condução da brotação. Por outro lado, não é pela simples razão que a planta possui lignotúber que se possa negligenciar esses mesmos fatores de gestão silvicultural para melhor rebrota.

As espécies de eucaliptos que possuem lignotúbers tendem a ser mais tolerantes ao frio, seca e ao desfolhamento por geadas, lagartas predadoras, etc. Já espécies que não possuem lignotúbers compensam fisiologicamente essa deficiência pela muito maior produção de sementes na busca de preservação de seus genes, mais uma notável sabedoria da mãe Natureza.

Além da presença do lignotúber (que se traduz em uma virtude nas mudas), o produtor de mudas florestais deve prestar muita atenção no diâmetro das plantinhas na altura do coleto. Há fortes evidências que as mudas mais grossas nessa região são mais resistentes no campo e possuem assim maior percentagem de pegamento. Tais mudas apresentam inclusive maior capacidade de brotação, caso sejam danificadas mecanicamente ou vítimas de alguma praga que coma suas folhas e ramos aéreos, mas deixem intacto o lignotúber.

O lignotúber, que lembra um caroço ou galha de predador na muda jovem, vai perdendo gradualmente esse formato conforme as árvores da floresta plantada de eucalipto crescem em condições favoráveis de meio ambiente. Quando a planta atinge cerca de 4 a 5 metros de altura, praticamente já não se nota mais nenhum tipo de formação globosa ou de protuberância na região do colo da árvore, nas proximidades do solo. Entretanto, essa região mantém as suas características de lignotúber: reserva alimentícia e gemas em abundância. Na eventualidade de um dano à parte aérea dessa árvore, o lignotúber entra em ação lançando brotos para recuperar a árvore.

No caso da rebrota do lignotúber, muitos brotos tendem a surgir rápida e imediatamente, sem haver clara dominância apical de um deles. Caso a desbrota não seja eficientemente manejada e realizada com ciência após a colheita florestal, podemos ter inúmeros brotos finos e até mesmo tortuosos, conduzindo a um aspecto envassourado à planta. Os operadores da colheita e da silvicultura devem portanto conhecer muito bem e respeitar essa característica das plantas de alguns eucaliptos, para favorecer um manejo bem sucedido da brotação e da condução de novo povoamento a partir desses brotos.

As plantas adultas de eucaliptos não mostram portanto evidências morfológicas de seu lignotúber, a menos que sejam constantemente danificadas ou injuriadas por severos estresses consecutivos. Nesses casos, o lignotúber pode-se desenvolver em tubérculos desuniformes superficiais ou ligeiramente abaixo da superfície do solo, quando a planta vive em condições de extremas e severas condições para vegetação. Por exemplo, quando a floresta sofre inúmeros e sucessivos incêndios com morte freqüente da sua parte aérea.

Lignotúbers não são privilégios dos eucaliptos. Eles existem em diversos outros grupos taxonômicos de plantas. Em algumas situações de plantas que vivem em condições de extremo rigor, os lignotúbers transformam-se em estruturas até mais importantes que o próprio caule das árvores, dando um aspecto até mesmo surrealista à planta, pelo desenvolvimento de um enorme e disforme tubérculo semi-enterrado no solo. Esse não é definitivamente o caso dos eucaliptos nas condições de plantações comerciais, onde o lignotúber não exerce um papel mais relevante ao longo da rotação, exceto quando da colheita da árvore, quando suas gemas dormentes são ativadas e crescem como brotos.

Ao trocar idéias acerca do lignotúber com o grande "Amigos dos Eucaliptos", engenheiro florestal Teotônio Francisco de Assis, ele nos trouxe como sempre a sua sabedoria com as colocações técnicas que tomei a liberdade de reproduzir a vocês para encerrar essa seção:

"A maioria das espécies de eucaliptos têm lignotúber, mas apenas em algumas eles aparecem de forma mais evidente. Eles não são uma anormalidade e sim um mecanismo que as plantas de eucalipto e algumas outras espécies da família Myrtaceae desenvolveram para sobreviver após estresses como seca, geada, quebra do caule, ataque de insetos, doenças etc. É um artifício fisiológico das plantas para rebrotar profusamente. Não é um defeito e sim uma virtude."